Foto Consciencia Negra

Semana da consciência negra: Um olhar para o meio acadêmico.

“As políticas de ações afirmativas para ingresso na universidade são conquistas importantíssimas, mas não apagam de uma vez os séculos de opressão, de exclusão, de violências e silenciamentos das pessoas negras no Brasil.” As palavras são da professora e pesquisadora da Universidade Federal de Minas Gerais, Laura Guimarães Corrêa e dizem um pouco das reflexões que o dia 20 de novembro, Dia da Consciência Negra, suscitam, com um olhar em especial para meio acadêmico.

Essa data, que convida a população a refletir sobre como é a inserção do negro na sociedade brasileira, é recente. Criada em 2003, como parte do calendário escolar, entrou para o calendário nacional em 2011. É um dia especial porque leva população a pensar a realidade das pessoas negras no Brasil, com apenas 130 anos desde a abolição.

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Olhando para o meio acadêmico, fica explícita a grande diferença racial presente entre os pesquisadores. Embora a implementação da política de cotas tenha melhorado visivelmente essa realidade, ainda hoje, de acordo com a PNAD Contínua de 2017, a porcentagem de brancos com 25 anos ou mais que tem ensino superior completo é de 22,9%. Essa situação muda quando se analisa a população negra: apenas 9,3% da população considerada negra ou parda tem um diploma de ensino superior.

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Consequentemente, isso impacta na quantidade de pesquisadores negros e negras desenvolvendo pesquisas no meio acadêmico. A professora Laura Guimarães Corrêa percebeu uma mudança na quantidade de negros nas universidades graças às políticas de ações afirmativas. Ela percebe que, quando eles têm interesse pela área acadêmica, as pesquisas desenvolvidas são voltadas para a temática racial, nas mais variadas áreas. Pesquisas que contribuem para a mudança na relação do brasileiro com as questões raciais.

Se há pouca representatividade negra no meio acadêmico, quando fazemos o recorte de mulheres negras fazendo pesquisa no Brasil, os números contam ainda mais. Segundo dados coletados no Censo de Educação Superior em 2016, 10 mil professoras doutoras que atuavam em programas de pós-graduação eram brancas, enquanto 219 eram mulheres pretas somando apenas 0,4% desse total. Para Laura, convencer as pessoas de que ela era uma pesquisadora competente foi uma das maiores dificuldades durante seu percurso na academia. “É o que demanda mais trabalho, pois a academia é uma instituição predominantemente masculina e branca”, comenta a pesquisadora.

Apesar desses números mostrarem que a universidade ainda é um lugar de homens brancos fazendo ciência e por isso seja para Laura, que é uma mulher negra e pesquisadora, muitas vezes um local de solidão, a professora não se imagina fazendo outra coisa, sentindo-se muito realizada na vida acadêmica. “É algo muito rico epistemologicamente estar nesse lugar do “outro”, um lugar de invenção,de criatividade, de buscar novas formas de aprender, de ensinar e de pesquisar, de buscar outros olhares e outras vozes.”

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E Laura não está sozinha. Há grandes nomes de mulheres e homens negros que foram relevantes para a ciência, mas que infelizmente não têm suas histórias tão conhecidas. Como é o caso de Sônia Guimarães, primeira negra brasileira doutora em física pela University of Manchester Institute of Science and Technology , e hoje, professora do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA). Nomes como Simone Maia Evaristo, a única brasileira como membro diretor da Academia Internacional de Citologia (IAC) supervisora na do Instituto Nacional do Câncer (INCA), Luiza Bairros, ativista negra que foi ministra da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR) durante o segundo governo Dilma Rousseff ou de Enedina Alves , a primeira mulher negra a se formar em engenharia no Brasil. Esses nomes deveriam ser mais lembrados, ajudando na contribuição para uma sociedade menos racista.

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Que as reflexões de 20 de Novembro, Dia Nacional da Consciência Negra, levem o meio acadêmico a refletir sobre a vida e situação da população negra que produz ciência no Brasil.